1.3.10

Fevereiro



Soneto Contrariado

Por ser o cedo tarde e o tarde cedo;
por ser tarde a manhã e a noite dia;
por ser gostosa a dor, triste a alegria;
por serem ódio amor, coragem medo;

Se o plágio é mais invento que arremedo;
se exprime mais virtude o que vicia;
se nada vale tudo que valia;
se todos já conhecem o segredo;

Por ser duplipensar barroco a língua;
por menos ter aquele que mais quer;
se a falta excede e tanto abunda a míngua;

Por nunca estar o nexo onde estiver,
desdigo o que falei e a vida xingo-a
de morte, se a cegueira é luz qualquer.

Glauco Mattoso




Perdi a conta de quantos dias passei sobrevivendo a Porto Alegre. Noites mal dormidas, ruídos do ventilador, a água escorre quente, o ar não circula. O calor, em excesso, deforma.

Um diagnóstico precipitado. Pressão ocular elevada, suspeita de glaucoma, uma doença silenciosa. Fixo meus olhos (olho com tal arte que esqueço olhar olhando) nos teus (imperfeição genética). A fixidez é momentânea. Você teme e aninha-se em mim. Repito teu nome, mas chamo o outro solstício. O calor, em excesso, paralisa.

Brindamos a Hypnos, uma noite de son(h)o, finalmente. Antes que o sol deixe aquário, levarei comigo a mensagem na garrafa. Queria te trazer aqui para o centro do meu peito, falar tonterias, rir à toa, uma parte em mim agora teima em se tornar adulta. O calor, em excesso, amor(tece).

Nenhum comentário:

Postar um comentário